Vale-Refeição e Vale-Alimentação poderão mudar em breve

O vale-refeição e o vale-alimentação, um benefício essencial para milhões de trabalhadores brasileiros, podem passar por mudanças significativas nos próximos meses. Uma proposta do governo federal em estudo busca reformular a gestão desses benefícios, que movimentam cerca de R$ 30 bilhões anuais. A ideia é centralizar a administração dos vales, atualmente controlada por empresas terceirizadas, em uma plataforma única gerida pelo Ministério do Trabalho. Essa medida visa reduzir fraudes e aumentar a transparência, mas especialistas e trabalhadores alertam para riscos, como a perda de autonomia e possíveis cortes nos valores repassados.
Histórico e Evolução do Programa de Alimentação do Trabalhador (PAT)
O Programa de Alimentação do Trabalhador (PAT) foi instituído pela Lei n.º 6.321, em 14 de abril de 1976, visando melhorar a situação nutricional dos trabalhadores e prevenir doenças ocupacionais, oferecendo incentivos fiscais às empresas participantes. Inicialmente, os benefícios eram distribuídos em vales-papel, o que os tornava suscetíveis a fraudes e revendas clandestinas.
Na década de 1990, houve uma migração para cartões magnéticos, que reduziram os furtos, mas ainda apresentavam lacunas na fiscalização. Com a introdução dos cartões com chip nos anos 2000, ganhou-se maior controle sobre bloqueios de saldo e rastreamento de transações, iniciando um debate sobre a digitalização completa, incluindo a integração com carteiras virtuais. No entanto, a adoção em larga escala ainda depende de regulamentação adicional e credenciamento de estabelecimentos digitais.
Esse meio de pagamento sempre foi acompanhado de problemas. De início, havia baixa aceitação dos tickets, como foram popularmente conhecidos, dependentes da adesão dos comerciantes. Havia também o problema dos contra-vales, o equivalente ao troco do vale-refeição, condicionado a voltar no consumo no estabelecimento. Isso tudo, sempre cercado com problemas de extravios, furtos e até roubos. Nada impedia também que o trabalhador fizesse dinheiro com o ticket, vendendo-o com um deságio que podia chegar a 30% do valor.
Detalhes da proposta do governo
Em 14 de abril de 2025, foi noticiado que o governo federal pretende apresentar uma nova regulamentação do PAT em até 30 dias. A proposta visa centralizar a gestão dos vales-refeição e alimentação em uma plataforma única sob a coordenação do Ministério do Trabalho e Emprego. Isso implicaria na eliminação das operadoras privadas, como Alelo e VR, cujo mercado movimenta mais de R$ 150 bilhões por ano, transferindo a administração e repasse dos recursos diretamente para contas vinculadas aos trabalhadores, possivelmente via Pix.
Ou seja, ao simplificar e eliminar intermediários, há espaço para uso desses gastos de modo mais eficaz, talvez até mesmo revertendo em ampliação do benefício para o trabalhador.
Objetivos principais
O projeto tem como metas principais evitar que custos operacionais e taxas cobradas pelas empresas intermediárias sejam repassados aos trabalhadores, garantindo que o valor integral destinado à alimentação seja disponibilizado sem descontos ocultos. Além disso, busca padronizar regras para impedir reduções unilaterais nos valores dos benefícios por parte dos empregadores, assegurando a manutenção do montante mínimo legal.
Mecanismos de Implantação
A proposta prevê a criação de uma plataforma digital única, gerida pelo Ministério do Trabalho, que concentrará o cadastro de empresas, trabalhadores e estabelecimentos credenciados. O repasse poderá ser realizado via Pix para contas específicas de alimentação, eliminando a necessidade de cartões físicos e reduzindo custos de impressão e logística. Para a transição, empresas de tecnologia e fintechs deverão integrar-se ao sistema, seguindo regras de segurança e interoperabilidade definidas em portaria ministerial.
Posição no legislativo
Embora ainda não haja um Projeto de Lei protocolado no Congresso, o tema é uma prioridade da equipe econômica desde o início de 2025. O ministro da Fazenda incluiu a regulamentação do mercado de benefícios na agenda para combater a inflação de alimentos. Grupos de trabalho já foram formados para elaborar estudos de viabilidade jurídica e estimativas de custo de implantação, mas até janeiro de 2025, não houve avanços decisórios formais.
Impactos e riscos
A centralização da gestão pode reduzir fraudes, uma vez que sistemas públicos tendem a adotar protocolos de auditoria mais rigorosos. A transparência permitirá que trabalhadores e a sociedade acompanhem a aplicação dos R$ 30 bilhões movimentados anualmente no setor. Com a digitalização via Pix, o uso em pequenos estabelecimentos e feiras livres será ampliado, garantindo o acesso a produtos de hortifrúti.
Entretanto, especialistas alertam que a falta de flexibilidade para ajustar benefícios conforme as condições financeiras das empresas pode onerar pequenos e médios empregadores. A burocracia de um sistema público centralizado pode resultar em atrasos nos pagamentos, impactando a subsistência dos trabalhadores. Além disso, sem uma previsão orçamentária clara, há receio de que o governo utilize o novo modelo para reduzir os valores nominais dos benefícios.
Reações dos envolvidos
Nas redes sociais, muitos trabalhadores expressam receio de que a gestão pública seja menos ágil que a privada, resultando em falhas no atendimento. Outros defendem o fim dos “lucros abstratos” das operadoras, considerando o modelo estatal mais justo. Sindicatos e a Confederação dos Servidores Públicos do Brasil apoiam a redução de taxas, incentivando arranjos abertos que utilizem bandeiras de cartão de crédito para baratear custos. Por outro lado, grandes empresas de benefícios argumentam que a diminuição de sua atuação inviabilizaria o PAT para pequenas empresas, que dependem do suporte de uma rede física de atendimento.
Perspectivas e próximos passos
O sucesso da reforma dependerá da elaboração de regulamentação clara, especialmente quanto a prazos de implantação, responsabilidades de manutenção e fontes de financiamento da plataforma única. Estabelecer indicadores de desempenho e canais de feedback será fundamental para o ajuste contínuo do sistema. Nos próximos meses, espera-se a publicação de uma Portaria ou Medida Provisória que formalize a proposta, com consultas públicas previstas para envolver a sociedade civil, empregadores e operadoras de tecnologia.
Essa proposta representa um marco potencial na modernização de um benefício de quase 50 anos, e cabe ao governo, ao Congresso e aos diversos atores envolvidos garantir que sua essência — promover uma alimentação saudável e acessível ao trabalhador brasileiro — seja preservada e aprimorada.